O fim de uma era — afastamento de uma lenda e a encruzilhada de uma selecção

Cristiano Ronaldo

No panorama do futebol nacional, poucas figuras foram tão omnipresentes como Cristiano Ronaldo, cuja carreira foi construída com metas atingidas, recordes quebrados e uma imagem de atleta inabalável. No entanto, o incidente mais recente mostra que até as maiores estrelas não estão imunes à queda — e a sua exclusão da seleção nacional representa muito mais que uma suspensão: é o derradeiro sinal de que a era de dominação individual dá lugar à necessidade de renovação coletiva.

O lance que precipitou esta decisão marca um momento simbólico. Durante um jogo de qualificação, Ronaldo foi expulso por agressão a um adversário, gesto que refletiu frustração e tensão acumuladas. Este foi o primeiro cartão vermelho da sua larga carreira internacional: 226 jogos ao serviço da seleção antes de este momento. A gravidade da situação ultrapassa o acto em campo — o reflexo imediato é o impacto sobre o vestuário, a liderança e o futuro da equipa que sempre girou em torno da sua figura central.

A decisão da comissão técnica de afastá-lo vai além da simples aplicação de sanção disciplinar. Trata-se de repensar o projecto da seleção e a dependência crescente de um jogador que, por muitos anos, foi o principal – senão o único – motor ofensivo e imagem pública. O afastamento obriga à pergunta: quem é o próximo alicerce desta equipa? Como garantir continuidade, competitividade e identidade sem o jogador que durante tanto tempo definiu o rumo?

Os reflexos desta mudança já se fazem sentir. A equipa passa obrigatoriamente por um momento de viragem: o capitão deixa de estar disponível, e com isso desaparece o pilar simbólico que galvanizava os colegas. É uma oportunidade para emergir nova liderança, para que jovens talentos assumam protagonismo e para que o colectivo volte a ser mais do que a soma de estrelas. Para a federação e para o corpo técnico, trata-se de redefinir estratégias – tácticas, motivacionais e de comunicação – num contexto em que o desgaste humano e a inevitabilidade temporal tornaram inevitável uma nova fase.

Para Ronaldo, o afastamento significa muito mais do que uma interrupção competitiva. É um momento de balanço, de despedida gradual ou abrupta, de reformulação da própria imagem. A glória dos números continua intacta, mas este cenário recorda que o futebol não é só feitos individuais. Em campo, a equipa não se chama «Cristiano Ronaldo e os outros» — e, se alguma vez foi, chegou agora o momento de virar a página.

A população de adeptos está dividida entre compreensão pela grandeza construída e frustração pelo gesto que pôs fim à sua presença imediata. A imprensa, já cansada de repetir feitos, agora analisa simbolismos: era um intocável — tornou-se vulnerável. Dentro do balneário, abre-se um espaço para reflectir sobre cultura da seleção, hábitos de liderança e preparação mental em torneios de alta carga.

Seja qual for a duração desta ausência, o impacto já é profundo. A seleção entra em território desconhecido — não apenas privado do seu maior nome, mas confrontada com a questão de se recusar a ser apenas uma réstia de passado ou se projectar de facto para o futuro. O adeus não anunciado de uma figura emblemática pode funcionar como libertação ou como derrota simbólica. A forma como o colectivo reagirá a este novo cenário dirá muito sobre o que vem a seguir.

Em suma, o afastamento de Cristiano Ronaldo da seleção não é apenas uma notícia de futebol — é uma viragem histórica. Uma era fecha-se, e o futuro chama com exigências diferentes: de equipe, de identidade e de pertença. Resta saber se Portugal aceitará o desafio de reinventar-se ou se olhará para trás, na esperança de poder voltar a contar com um passado que já se fez história.