Aveiro em disputa: habitação, trânsito e o futuro do Cais do Paraíso viram campo de batalha eleitoral

As próximas eleições municipais em Aveiro têm gerado intenso debate sobre três temas estruturantes: habitação, mobilidade urbana e o ambicioso plano para o Cais do Paraíso. Candidatos à presidência da Câmara propõem rumos distintos para cada uma dessas áreas, revelando visões diversas sobre como a cidade deverá evoluir nos próximos anos.
Habitação: da promessa de público ao controle de preços
Na vertente habitacional, o discurso dos candidatos distingue-se entre quem aposta em intervenções diretas do município e quem enfatiza incentivos ou parcerias. Propostas como habitação pública a custos controlados aparecem com frequência, buscando responder à escassez de soluções acessíveis dentro do concelho. Outra ideia recorrente é a criação ou reforço de cooperativas de habitação — organizações que permitiriam gestão comunitária ou partilhada para aliviar encargos para famílias com menor poder económico. Também se debate a penalização fiscal de imóveis devolutos como forma de estimular a utilização dos espaços existentes.
Há ainda quem proponha medidas voltadas aos estudantes deslocados, com alojamento que facilite permanência no concelho, evitando pressões sobre oferta habitacional tradicional ou crescimento de arrendamento informal. A habitação, assim, emerge não só como problema de teto, mas de equidade urbana.
Mobilidade: entre ciclovias, elétricos e alternativas ao carro
No campo da mobilidade, os candidatos desenham soluções variadas, algumas ousadas. Reduzir o “engarrafamento” em eixos principais da cidade aparece como urgência comum. Propostas incluem intervenções de tráfego, circulação e requalificação de vias urbanas, com ênfase em espaços pedonais e nas ligações entre diferentes freguesias.
Uma parte dos concorrentes prioriza a mobilidade suave e sustentável: expansão de rede ciclável, integração intermodal de transportes, criação de passes que combinem autocarros, bicicletas partilhadas ou elétricas. Infraestrutura para veículos elétricos — como postos de carregamento distribuídos — também está presente nos planos, com a meta de modernizar o transporte, aliviar congestionamentos e reduzir emissões.
Cais do Paraíso: hotel, altura dos edifícios e preservação ambiental
O Cais do Paraíso tornou-se talvez o projeto mais simbólico e divisivo da campanha. O Plano de Pormenor aprovado abre caminho para a construção de um hotel de 12 andares naquela zona, o que gerou reações fortes por parte de diversos candidatos e partidos. A proposta é contestada principalmente por sua altura — consideram-a excessiva num local de entrada da cidade — e pelo impacto visual e paisagístico, assim como pela falta de estudos ambientais públicos robustos, especialmente em áreas vulneráveis a fenómenos climáticos.
Críticos defendem que o espaço deveria priorizar uso público, parques verdes ou equipamentos comunitários, em lugar de empreendimentos privados de grande porte. Há ainda objeções quanto à gestão de solo, drenagem, a impermeabilização e como o hotel poderá alterar a relação da cidade com a Ria de Aveiro, direta via de natureza e turismo.
Tensões institucionais e eleitorais
Outro elemento que permeia o debate é a legitimidade de decisões tomadas pelo atual executivo em fase de transição eleitoral. Proponentes da mudança alertam que projetos aprovados agora poderão comprometer o futuro da cidade para além do mandato corrente. Há discordâncias sobre a necessidade de revogação ou alteração de planos já aprovados, bem como sobre transparência no processo legislativo que permitiu o avanço de certas decisões.
O que está em jogo
Estas disputas mostram que Aveiro atravessa momento crítico: não se trata apenas de escolher um candidato, mas de decidir modelo urbano. A habitação pode se tornar instrumento de justiça ou de exclusão; a mobilidade poderá ser caminho para mais qualidade de vida ou manutenção do impasse de trânsito; o Cais do Paraíso simboliza a tensão entre revitalização urbana e preservação ambiental.
O eleitorado está diante de escolhas concretas sobre como quer ver sua cidade: um Aveiro mais inclusivo, sustentável, visualmente integrado com seus recursos naturais, ou um Aveiro orientado por grandes empreendimentos privados. O desfecho definirá não apenas quem administra, mas, sobretudo, que tipo de cidade Aveiro será nos anos vindouros.