Infantino e o delicado equilíbrio entre futebol e política em meio à crise de Gaza

No panorama global cada vez mais conflituoso, o presidente da FIFA, Gianni Infantino, reafirmou a posição de que o futebol, por mais que esteja interligado a realidades humanas com forte carga emocional e simbólica, não deve interferir diretamente na política. A sua intervenção ocorreu num momento de crescente pressão internacional para que a entidade máxima do futebol tome uma posição mais clara em relação ao conflito em Gaza, com pedidos de sanções, exclusões e gestos de solidariedade explícita.
Infantino reconheceu que o futebol sozinho não tem capacidade para resolver disputas geopolíticas profundas. Alertou que o campo de jogo não substitui mesas de negociação, diplomacia ou esforços humanitários, mas defendeu que, mesmo assim, o desporto tem uma função importante: a de transmitir mensagens de paz, união e empatia. A sua ideia é que o futebol pode ser veículo de valores sociais educativos, culturais e humanitários, capazes de aproximar-se das pessoas que vivem sob sofrimento ou divisão.
Num encontro de instâncias da FIFA realizado em Zurique, Infantino admitiu que conduzir esse tipo de abordagem exige cautela. Disparidades regionais, divergências entre confederações e o risco de politização exagerada são obstáculos reais. Ele ressaltou que qualquer decisão ou posicionamento mais severo – como a suspensão de uma federação ou exclusão de uma seleção – depende não só de uma base regulatória clara, mas sobretudo de consenso entre os membros da instituição.
O dirigente observou que já há apelos de autoridades palestinas para que Israel seja suspenso do futebol internacional, dada a gravidade da situação em Gaza. No entanto, a FIFA ainda não optou por esse caminho. Mantém-se um debate interno, mas até ao momento as ações concretas permanecem restritas a manifestações de solidariedade verbal e à clara rejeição de que o desporto seja usado como instrumento de divisão.
Infantino sublinhou também que, embora Israel participe em competições europeias sob a égide da UEFA, os regulamentos estabelecem que certas decisões – como exclusão ou sanções específicas – são competência das confederações regionais. Este recorte de responsabilidades torna o caminho institucional mais complicado, pois envolve múltiplos atores, cada qual com sensibilidades distintas.
Por outro lado, há quem argumente que a FIFA já definiu precedentes, como no caso da Rússia, em que, após a invasão da Ucrânia, houve sanções combinadas com confederações europeias. Tais medidas geraram tanto apoio quanto críticas, sobretudo no que toca a coerência, critérios de aplicação e consequências para atletas civis ou selecções com ligações diretas ao conflito.
O discurso de Infantino, embora moderado, coloca em evidência tensões centrais: a legitimidade política do futebol; os limites entre ato simbólico e responsabilidade institucional; e o dilema sobre quando e como o desporto deve intervir, especialmente quando direitos humanos ou sofrimento civil estão em causa.
Ao rejeitar a ideia de que a FIFA deva abandonar sua neutralidade política institucional, Infantino lança uma reflexão ampla: a de que o futebol pode e deve ser um palco de valores, mas sem se tornar árbitro de disputas jurídicas ou territoriais. Para muitos observadores, esse posicionamento mostra tanto prudência quanto fragilidade — prudência por evitar que a instituição se torne refém de instabilidades políticas; fragilidade porque, em situações como a de Gaza, há quem espere que organizações globais assumam posições mais fortes, não apenas discursivas.
Em última análise, o debate provocado por Infantino revela que o futebol, por causa de sua visibilidade, será sempre pressionado por demandas morais além do campo — e que a resposta da FIFA a essas demandas determina não apenas sua credibilidade institucional, mas também seu papel real no mundo contemporâneo, onde as arenas esportivas têm se tornado espelhos de conflitos e esperanças coletivas.